Nos últimos anos, a cesariana tem sido uma das cirurgias mais prevalentes em mulheres. Entre as principais razões está a opção por esta cirurgia como forma de “proteger o períneo”, com medo que o parto vaginal possa implicar trauma ou disfunção nesta região, um mito que ainda se mantém bem vivo aos dias de hoje.
Na verdade, segundo estudos recentes (1,2) não será tanto o tipo de parto, mas sim a gravidez por si só que parece influenciar a (dis)função do pavimento pélvico. O facto de termos um bebé a crescer durante 9 meses no nosso útero provoca um aumento gradual da pressão, a qual se faz sentir no períneo e nas suas estruturas vizinhas, tais como: diafragma, parede abdominal e coluna lombar.
Por esta razão, é importante que a mulher procure ser ativa durante a gravidez, preferencialmente com um conjunto de exercícios que mantenham a musculatura abdomino-lombo-pélvica bem íntegra e capaz. Por outro lado, torna-se importante realizar uma avaliação à função destas estruturas após o parto, independentemente do tipo de parto.
É também importante ter em conta que, sendo a cesariana uma cirurgia, vai implicar um tempo de recuperação mais longo. Durante este procedimento, são vários os tecidos que são cortados até chegar ao nosso bebé, comprometendo, de certa forma, a função de toda a região abdomino-lombo-pélvica. Esta será, por isso, um dos nossos focos na recuperação pós-cirúrgica.
Nas primeiras semanas de pós-parto, o corpo vai precisar de descanso para se auto-regenerar. Suportar a região da cicatriz com as mãos sempre que antecipar qualquer esforço (levantar, agachar, espirrar) ajuda a aliviar a pressão sobre a mesma, prevenindo complicações e desconfortos adicionais.
A realização de respirações diafragmáticas será um bom ponto de partida para o recrutamento da musculatura local e a mobilização interna dos tecidos da cicatriz.
Um ponto importante na recuperação será a realização da massagem da cicatriz abdominal resultante da cesariana. Deverá iniciar-se na ausência de sinais inflamatórios, por volta das 6 semanas após o parto. Nos principais objetivos desta massagem estão a prevenção da formação de fibroses e aderências entre os tecidos que foram cortados durante a cirurgia e assim prevenir complicações relacionadas com a formação das mesmas, tais como: obstipação, dor pélvica crónica, dor na relação sexual, infertilidade (3) – as quais, por seu lado, podem também ter um impacto negativo no períneo.
É frequente haver alterações de sensibilidade na região da cicatriz. Nestes casos pode despertar-se esta zona, através de estimulação com objetos de texturas diferentes : algodão, escova de dentes, tecidos rugosos e outros mais macios.
Por último, é importante não descuidar a recuperação muscular. Tal como falado anteriormente, a cesariana deve ser tratada como uma cirurgia abdominal. Como qualquer cirurgia deste tipo, poderá levar a um enfraquecimento da musculatura abdomino-pélvica, que parece muitas vezes ficar “adormecida”. É por isso importante ajudar a “acordá-la”, integrando-a nos movimentos do dia-a-dia. Posteriormente, trabalhar também a postura, a mobilidade e o alongamento dos músculos à volta da cicatriz vai ajudar a evitar a tendência natural para uma postura “mais curvada” (em flexão) que acaba por ser desenvolvida inconscientemente como forma de “proteger a cicatriz”.
Se passaste por uma cesariana recentemente, tens na UTERUS uma equipa multidisciplinar que te pode apoiar neste processo de recuperação.
BIBLIOGRAFIA
1. Bozkurt M, Yumru AE, Şahin L. Pelvic floor dysfunction, and effects of pregnancy and mode of delivery on pelvic floor. Taiwan J Obstet Gynecol. 2014 Dec; 53(4):452-8
2. Cacciatore, Alessandra et al. “Putative protective effects of cesarean section on pelvic floor disorders.” Journal of Prenatal Medicine vol. 4,1 (2010): 1-4.
3. Salim R, Kadan Y, Nachum Z, Edelstein S, Shalev E. Abdominal scar characteristics as a predictor of intra-abdominal adhesions at repeat cesarean delivery. Fertil Steril. 2008 Dec; 90(6):2324-7.
4. Wasserman, Jennifer & Abraham, Karen & Massery, Mary & Chu, Jennifer & Farrow, Alicia & Marcoux, Beth. (2018). Soft Tissue Mobilization Techniques Are Effective in Treating Chronic Pain Following Cesarean Section: A Multicenter Randomized Clinical Trial. Journal of Womenʼs Health Physical Therapy. 42. 1.